sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Possível arma contra o câncer está no Nordeste




Possível arma contra o câncer está no Nordeste

Saúde // Estudo quer comprovar benefícios do avelós, vegetal encontrado na região, no combate às células cancerígenas

Tatiana Sabadini // tatianasabadini.df@diariosassociados.com.br

Brasília - Uma das alternativas em estudo para enfrentar o câncer está mais perto do que se imagina. Pesquisadores brasileiros descobriram que o latéx de uma planta venenosa muito comum no Nordeste mostra potencial para enfrentar as células cancerígenas. O avelós pode se transformar numa arma contra o efeito devastador da doença no organismo. Os testes em laboratório foram positivos - agora, o desafio passa a ser fabricar um remédio eficaz. Nos corredores dos hospitais, uma infusão da seiv
a da planta é conhecida como garrafada. Um segredo passado de paciente para paciente. Foi a partir da crença e dos relatos de casos de supostas curas que os médicos decidiram analisar o mistério.

A dor forte no abdômen veio de repente e enfraqueceu Fátima Dias, 55 anos. Foram quatro dias no hospital e intermináveis exames até aparecer o diagnóstico de um tumor maligno no intestino, que causou metátese no fígado. "Eu nunca sequer imaginei que eu poderia ter câncer. Eu sempre tive uma alimentação saudável, praticava exercícios e me cuidava. Foi muito difícil enfrentar isso", confessa a servidora pública. Ela retirou os tumores e partiu logo em seguida para o tratamento convencional. Foi durante as conversas com outros pacientes na sala de quimioterapia que ela descobriu o avelós. O produto vinha em uma garrafa de dois litros, com um copinho de cachaça. Segundo as recomendações
do boca a boca, ela teria que tomar uma dose antes das refeições. E assim fez regularmente.

Em agosto, Fátima fez todos os exames e estava tudo normal. Menos de um ano depois da primeira dor, ela está clinicamente curada. "Nem meu médico acreditou, disse que era um milagre, que não deveria ser assim tão rápido", alega. O tratamento tradicional foi feito, mas o médico da servidora não sabe que ela também usou a planta tóxica como remédio. "Quando você tem uma doença como essa, tem que apelar para todos os lados. A cada dia eu me sinto melhor e acho que devo isso ao avelós", diz.

Obviamente, o câncer de Fátima pode ter sido derrotado pela quimioterapia e todo o arcabouço de soluções convencionais - as únicas comprovadas para enfrentar a doença, ao menos por enquanto -, mas ainda há de se descobrir se o avelós teve alguma participação na melhora da paciente.

A história de Fátima se repete em diversos lugares do país. Diversos estudos vêm sendo feitos desde os anos 1960, mas nenhum havia obtido algum resultado concreto até hoje. Em 2003, porém, um empresário produtor de cachaça procurou um farmacêutico e pesquisador para descobrir mais sobre aquela planta que tinha curado duas pessoas da família dele do câncer. Luiz Francisco Pianowiski aceitou o desafio. Nos primeiros teste de laboratório in vitro, as substâncias da planta conseguiram matar as células cancerígenas. Foram feitos estudos toxicológicos em animais roedores e não roedores, nesse caso ratos e cães com a doença. Conforme a legislação vigente no Brasil, os animais foram observados durante três meses para verificar se existiam maiores problemas no fígado ou no organismo. De novo, os resultados foram positivos.

Era hora de colocar o teste em prática em humanos. "Foi preciso identificar a molécula que tinha esse efeito nas células para seguir em frente. Foram quase seis anos para fazer a fórmula", conta Pianowski, coordenador-geral do projeto - organizado pela Amazônia Fitomedicamentos. A primeira fase do teste em humanos foi feita no Hospital Albert Einstein. Sete pacientes com diferentes tipos de tumores e em estado terminal de câncer receberam o remédio, batizado de AM10. "Os resultados ainda foram preliminares. Uma paciente com câncer de pele (melanoma) teve sucesso, mas o tumor voltou depois de algum tempo", explica Auro Del Giglio, gerente do programa integrado de oncologia do Einstein.

Segunda fase - A chamada fase 1, no entanto, não estava atrás da cura. Os testes queriam medir a toxicidade do medicamento e se ele poderia ser usado em humanos sem danos ao organismo. Atualmente, depois de receber uma autorização da Agência de Vigilância Sanitária, os médicos esperam poder começar a fase 2. Os testes serão feitos com quase 200 pessoas com câncer de mama em cinco hospitais da cidade de São Paulo. "Primeiro descobrimos a dose certa, agora vamos ver se existe mesmo um benefício e na fase três vamos poder fazer uma comparação", diz o oncologista.

A última fase será feita com pacientes que já tenham feito algum tipo de tratamento e estejam com câncer de mama ou de próstata. "Vamos delimitar a doença primeiro, porque o custo é muito alto, e ficar com as duas principais incidências aqui no Brasil. Mas o objetivo é expandir, até mesmo por uma questão de compaixão com os pacientes que precisam do medicamento", diz Pianowiski.

Apesar de todo o estudo e da esperança de uma eventual cura com o remédio, o cientista não acredita que o avelós seja uma solução e sim uma alternativa. "Vai ser uma nova ferramenta para os médicos no tratamento com câncer. E o melhor, vai ser algo 100% nacional. Mais de R$ 15 milhões já foram gastos com o projeto. Durante o processo, os médicos perceberam que a planta também alivia a dor. "O remédio tem uma ação analgésica e a gente vai estudar isso também. Muitas pacientes melhoraram, não reclamavam mais da dor. Então, ele poder ser um remédio forte para outros pacientes também", afirma Del Giglio. Outro estudo será feito para produzir um segundo medicamento, batizado de AM11, que usaria as propriedades analgésicas e anti-inflamatórias da planta.

Advertência - Enquanto a pesquisa não é concluída, os médicos não recomendam o uso da popular garrafada. "É preciso ter cuidado, porque é uma substância muito forte. Em alguns lugares, ela é conhecida como cega-olho, porque se o látex pegar no olho, pode até causar cegueira. É uma planta muito tóxica e, se não for consumida na dose certa, em vez de curar, ela pode causar problemas", alerta Pianowiski.

Fonte: Diario de Pernambuco - 25/10/2009

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